segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Entrevista com Teresinha América para Café com Siéllysson



 Entrevista 16



Professora há mais de quarenta anos, dedicada à profissão, uma mulher que passou próximo a morte e venceu, tornou-se agradecida à vida por tudo, celebra os dias com o mesmo ritual do café às 16 horas para quem quer que chegue em sua casa. Recebeu o título de cidadã santa-ritense em 2007 e hoje em “Café com Siéllysson” fala sobre sua trajetória na Educação e no prazer de viver em Santa Rita. Conheça um pouco mais de Teresinha América.




SIÉLLYSSON- Sei que você iniciou sua carreira de professora muito cedo. Desde que ano você é professora?
TERESINHA - Desde 1974, antes dessa data eu já ensinava, dá um total de mais de 40 anos.

SIÉLLYSSON - Você é natural da cidade de Campina Grande, mas está em Santa Rita há muitos anos. Em 2007 você recebeu o título de cidadã santa-ritense. Que sensação você teve ao receber esse título?
TERESINHA - Foi muito emocionante porque eu aprendi a gostar de Santa Rita de graça, gostar mesmo. Já tive convite para voltar para Campina Grande, mas eu não quis e não quero mais. Eu me apeguei a esta cidade, então receber esse título foi muito emocionante pra mim. Eu achei que já era filha legítima de Santa Rita e não uma ilha adotiva. (brinca entre risos)

SIÉLLYSSON - (Brinco) Agora legalizou!
TERESINHA - Agora recebi o registro.

SIÉLLYSSON - Quando você chegou a Santa Rita houve um estranhamento por ter passado anos na cidade natal e ir para outro lugar?
TERESINHA - Houve, houve... Eu saí das minhas raízes e fui morar no sertão, foi logo a primeira saída minha, fomos morar na cidade de Catolé do Rocha onde passei três anos, aí já foi um impacto muito grande, sair da minha cidade, na época fazia Universidade, com minha família toda em Campina, e seguir pra Catolé do Rocha pra acompanhar meu esposo que tinha sido transferido pra lá.
Então, morar lá já foi um choque, chegamos em pleno sertão numa seca, com costumes diferentes, linguagem diferente...tudo, tudo era diferente. Depois me adaptei, eu tenho essa facilidade de adaptação às pessoas, a lugares e à linguagem. Logo me adaptei aos costumes e a linguagem que me interessa muito. Vou te contar um caso assim que cheguei por lá; uma menina estava sentada no muro da casa e uma mulher disse “Menina você vai cair da balustrada” e eu parei e disse pra mim mesma “meu Deus, eu na conheço essa palavra”, corri pra o dicionário para ver o que significava aquela palavra; e a palavra era balaustrada, que era a mesma coisa que muro...

SIÉLLYSSON - Era uma espécie de muro antigo...
TERESINHA - Exatamente! Mas eu nunca tinha escutado essa palavra. (risos) O primeiro choque cultural foi esse, depois me adaptei, até porque as pessoas do sertão são excelentes, são muito receptivas. É do caminhão chegar com a mudança e a vizinha chegar com a garrafa de café, perguntando se você precisa de alguma coisa, se tem água... Sabe essas coisas boas de gente boa? Bem, mas isso não aconteceu aqui [Santa Rita].
Quando eu cheguei aqui foi estranho. Foi no dia 12 de julho de 1988, num dia chuvoso, não via uma pessoa numa porta qualquer. Vim morar num lugar que eu não conhecia ninguém novamente... Na entrada da cidade eu disse: “Santa Rita, faça com que eu não me arrependa de ter vindo para cá”. Foi na BR quando eu vi a placa com o nome da cidade, eu pedia a ela (a santa) que eu não me arrependesse.

SIÉLLYSSON - Não se arrependeu em nenhum momento?
TERESINHA - Não. Pelo contrário, não quero mais sair daqui, já conheço todo mundo na cidade, isso me cativa. Não tenho mais vontade de ir embora.

SIÉLLYSSON - Então seu estranhamento foi pela recepção.
TERESINHA - Foi! Foi horrível, o povo dentro de suas casas, olhando desconfiados pra nós como quem diz “de onde vem esse povinho nômade?” (risos)

SIÉLLYSSON - Você passou por uma cirurgia depois de um ataque cardíaco. O que mudou em sua vida depois dessa experiência?
TERESINHA - Tudo! Eu me sinto mais humana, mais agradecida, porque nem agradecia muito pela vida, pelas coisas que consegui ao longo dos anos, pela minha família, minhas filhas e netos. Então, acredito que me tornei mais gente. (Brinca) Não sei se é o medo de morrer que faz a gente se rever. Foi terrível a experiência, mas tudo passou.

SIÉLLYSSON - Eu digo que há duas profissões que nos permitem conhecer muito bem o ser humano: a do psicólogo e a do professor. Você lida com a sala de aula há muitos anos. Há atitudes, ações que te surpreendem ainda?
TERESINHA - Há. Quando a gente faz uma retrospectiva de quando começou, como eram os alunos, a sociedade, a comunidade que agradecia, que valorizava o trabalho do professor, isso ficou gravado e hoje a gente não ver isso. Ninguém agradece mais ao professor... O aluno, o pai do aluno, a própria sociedade não valoriza, essa atitude é o que me choca ainda hoje. E penso que vai chocar ainda mais daqui pra frente com esse índice de violência que a gente ver nas escolas. A gente não tem segurança, o professor está de corpo aberto pra o que der e vier. E a questão da educação familiar contribui pra essa violência, pra essa desvalorização da escola, do professor.

SIÉLLYSSON - E o que há de melhor nessa profissão?
TERESINHA - Eu tive alunos que hoje são avós e que passam por mim e dizem “oi professora” com respeito e gratidão ainda. Aquele reconhecimento de falar com você em qualquer canto. Pra você ter ideia, Siél, eu dei um curso de literatura infantil nas cidades do sertão no tempo do governador Wilson Braga, (brinca com a questão financeira) foi quando eu ganhei um dinheiro bom (risos).
Eu fui a muitas cidades do interior do sertão e sempre ia um carro da Secretaria da Educação me pegar na rodoviária, ou me levar de uma escola pra outra. Teve um dia em que eu estava na cidade de Itaporanga, muito longe, quando eu estava esperando o carro da Secretaria, chegou o carro da polícia perto de mim, parou, aí o delegado da cidade saiu de dentro da viatura e falou “Professora o que a senhora está fazendo aqui nesse fim de mundo?” Ele foi meu aluno em Campina Grande e era delegado nessa cidade. E eu fiquei tão feliz parecia que eu tinha encontrado uma multidão. Pois, num lugar em que você não conhece ninguém, atordoado pra saber pra onde vai, com carro atrasado da secretaria e de repente vem um ex-aluno dizendo que vai lhe levar lá na escola. Eu expliquei que o carro da Secretaria de Educação ia me apanhar, agora imagine: eu chegando à escola em um carro da polícia. (risos) Então, são essas coisas que fazem a gente gostar de ser professor.

SIÉLLYSSON - Você participou desse Projeto Literário nas várias cidades do sertão da Paraíba. Lembro que certa vez você cogitou escrever um livro sobre essa experiência. Como anda esse Projeto?
TERESINHA - Esse livro eu comecei a escrever, mas parei. Está ali (aponta pra dentro da casa) pela metade. Não sei se vou concluir. Tem aquela frase que diz que pra você se realizar na vida, tem que plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro. Já tenho a árvore, filhos e o livro está pela metade... (riso) Não sei se completo.

SIÉLLYSSON - Espero que sim.
SIÉLLYSSON - Embora você tenha falado um pouco sobre a cidade de Santa Rita, mas qual a importância da cidade hoje para você?
TERESINHA - Ela é tão importante pra mim que me sinto em casa, por onde eu passo nas ruas e encontro as pessoas, me sinto mesmo em casa. Fico triste quando vejo pessoas que melhoram de vida, perderem o contato com a cidade e dizerem (imita) “Agora eu moro no Bessa, agora eu moro nos Bancários, aí vai ser bessianos, bancarienses e deixa de ser totalmente de Santa Rita.”

SIÉLLYSSON - Você não acha que essa é uma forma das pessoas santa-ritenses de saírem da cidade é desejo de se afirmarem como serem que ascenderam economicamente e acreditam que viver nos bairros de João Pessoa é um status e que viver em Santa Rita não tem status algum?
TERESINHA - Não. Eu já ouvi gente dizer que foi morar em João Pessoa para não ver suas filhas namorarem rapazes de Santa Rita e são pessoas santa-ritenses da gema. Isso eu não me conformo. Acredito que seja por comodismo, as pessoas querem sair daqui porque é cômodo. Mas esquecem que Santa Rita, assim como qualquer outra cidade, tem problemas de infra-estruturas, de violência, que já ganhou fama; a questão política, que os administradores não fazem muitas coisas pela cidade, mas é uma cidade comum como qualquer outra.
Terezinha América no lançamento do livro "Crônicas" com Siéllysson, em julho de 2013

SIÉLLYSSON - Que mensagem você deixa para os leitores do blog.
TERESINHA - A mensagem que posso deixar é que eu sou quase realizada vivendo em Santa Rita. E gosto das pessoas daqui do jeito que elas são e elas gostam de mim do jeito que sou.

Entrevista publicada em 16 maio 2012  às 23:15- quarta-feira

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