quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Café com Siéllysson entrevista a poetisa Maria de Lourdes Ferreira



Entrevista 01


Maria de Lourdes Ferreira, poetisa santarritense de 80 anos, mora atualmente no estado do Rio de Janeiro, e escreveu um polêmico livro de memórias em dois volumes, com 766 páginas que envolvem várias personalidades históricas do município de Santa Rita. Maria de Lourdes Ferreira abre a sessão "Café com Siéllysson"com chave de ouro.

SIÉLLYSSON - Você já publicou um livro de poesias "Estrelas Cadentes" em 2000 e reeditou em 2010. Há quanto tempo escreve poemas? E por que demorou tanto para publicar suas poesias?

MARIA DE LOURDES: - Escrevo poemas desde a época da escola primária. Muitos desses poemas se perderam na poeira do tempo. Até 1978 eu tinha um caderno com vários. Emprestei a uma pessoa e ela sumiu com meu caderno. Demorei a publicar minhas poesias porque nunca pensei em fazer isso, não entendia muito dessas coisas. Se quando jovem tivesse pensado eu não teria condição financeira mesmo. Não sei se você sabe, mas Estrelas Cadentes e o Entre Flores e Espinhos, são produções independentes. Depois veio a luta pela sobrevivência minha e dos meus filhos. E só agora na maturidade foi que tive tempo e condição financeira. Por um lado foi bom, pois vivi um grande amor e foi inspirada na pessoa amada que escrevi quase todos os poemas do Estrelas Cadentes. Eu continuo escrevendo poemas românticos quando sinto saudade da pessoa amada porque o tempo não apaga um amor tão intenso como o que vivi. Eu vivo das lembranças desse amor. Espero em breve lançar mais um livro de poesia que já tem título Pérolas do meu coração

SIÉLLYSSON - No ano de 2004, você escreveu a história da sua vida em dois volumes com uma riqueza de detalhes impressionante. Você sempre teve uma boa memória assim?

MARIA DE LOUDES: - No ano 2004 comecei a escrever a história da minha vida. Mas há anos que eu vinha fazendo anotações. Eu sempre tive uma boa memória. Na escola e nos cursos que fiz sempre tirei boas notas. Mas muitos fatos da minha vida estavam adormecidos no meu subconsciente e à medida que eu ia escrevendo eles iam surgindo. A minha família e pessoas conhecidas se admiram quando digo para alguém que uso computador e faz pouco tempo que fiz curso de informática, que escrevo esquete (peça rápida de no máximo 1/2 hora), nessas peças atuo e dirijo. Elas ficam de queixo caído. 

SIÉLLYSSON - O porquê de escrever sua história?

MARIA DE LOUDES: - Desde criança eu sempre dizia que quando envelhecesse iria contar minha vida em um livro. Minhas amiguinhas riam de mim, só que eu mesma não pensava que o meu percurso pela estrada da vida seria tão árduo. Por isso dei o título de Entre Flores e Espinhos. Flores pelos bons momentos e espinhos pelos maus que foram tantos. Por querer deixar para minha futura geração uma lição de vida. Porque a vida é uma montanha russa. Ora sobe, ora desce. Devemos nos equilibrar para cair.

SIÉLLYSSON- Quando você escreveu não pensou em usar um personagem fictício para não expor toda sua intimidade?

Pensei, e foi assim que iniciei, mas à medida que ia escrevendo tinha a impressão que estava contando a história de outra pessoa não a minha. Era como se fosse uma história criada pela imaginação, não na realidade. Eu não me importava de expor a minha intimidade, até mesmo as eróticas. Talvez tivesse repensado se fosse escrito anos atrás no período militar, mas atualmente não existe censura, as novelas e os filmes são exibidos com carga de realismo e erotismo e todos gostam.  Se fosse nos anos 50 ou 60 eu não escreveria sobre minhas intimidades principalmente amorosas, me referi ao preconceito da cidade de Santa Rita naquela época, onde tudo era considerado imoral; por uma bobeira fui expulsa do Clube Piratas do Santa Cruz em 1954. Relato no primeiro volume do meu livro de memórias, na página 452 conto como era o preconceito. Em 1964 quando teve início o período militar não tomei conhecimento porque tava em Pau-Brasil envolvida com casamento e gravidez e mesmo em Santa Rita não se falava muito no assunto. Só em 1970 aqui no Rio foi que me inteirei desses episódios. Sei que não fui ética ao escrever os verdadeiros nomes das pessoas que comigo conviveram, estou consciente disso. O livro não foi posto à venda, ficou em família. Só você, Siéllysson, tem os meus livros além de minha família; ao público somente os volumes que foram enviados para a biblioteca de Santa Rita por meio de você, são dois ou três volumes, que se alguém se sentir ofendido é só retirar.

SIÉLLYSSON - Praticamente todo o volume 1 se passa na cidade de Santa Rita, que hoje é muito diferente da cidade descrita por você. Qual sua relação com a cidade hoje em dia?

MARIA DE LOURDES: - Sim. Todo o volume 1 e metade do 2 se passa na cidade de Santa Rita. Quando meus pais vieram para este município eu era bebê de colo. Eu a considero minha cidade de origem. Foi onde cresci e vivi. Não tenho relação nenhuma com a cidade de Santa Rita de hoje. O pouco que sei dela é por meio do seu blog e quando visito o site oficial dela para saber notícias que, aliás, são bem desagradáveis. Não é mais a minha cidade.

SIÉLLYSSON - Você é uma mulher budista, num país dito cristão. Como se deu esse processo de conversão? Você tem muito que explicar as pessoas por praticar uma religião ainda pequena em nosso país?

MARIA DE LOURDES: - Ao conhecer o Budismo fiquei desconfiada por não conhecer a religião, Já havia lido alguma coisa a respeito mas nada de interesse profundo. A facção budista a que pertenço é a SGI. Aqui no Brasil é  Associação Brasil Soka Gakkai Internacional e a sigla e BSGI. Passei sete anos estudando tudo que dizia a respeito da religião, inclusive suas escrituras. Em 1984 me converti já sabendo o que queria, afinal foram sete anos de estudo. Tenho até o grau médio do Budismo. Foi assim que se deu minha convenção. Eu não tenho muito que explicar as pessoas. Quando me perguntam respondo o que sei e dependendo da pergunta, se a pessoa se interessar eu a convido para assistir nossa reunião porque lá tem pessoas que esclarecem melhor. Mas ensino a recitar o mantra.
Realmente o Budismo ainda está engatinhando em nosso país e dificilmente alcançará o Cristianismo. Acho que religião nenhuma aqui no Brasil se igualará ao cristianismo, quanto mais superar. Na minha família só eu e umas filhas praticamos o budismo, os outros membros da família não têm religião. Apesar de pequena a nossa facção muitos famosos são praticantes. A cantora Elza Soares, Bethe Farias, Diogo Vilela e muitos. Temos 192 países e território onde a facção SGI prevalece. Essa facção não tem templo e sim Sede Regional e Centro Cultural. No Brasil temos muitos colégio e creches Soka.

SIÉLLYSSON - Que parte da sua vida foi mais difícil escrever? E por quê?

MARIA DE LOURDES: - A parte mais difícil de escrever e que não contive as lágrimas, foi quando relatei a noite em que minha mãe atentou contra minha vida enquanto eu dormia. Acordei na hora H com a voz do meu falecido namorado me chamando desesperadamente. Esse rapaz era neto do Capitão Joca Medeiros. Quando acordei, ela estava empunhando um punhal em direção ao meu coração. Segurei fortemente o seu braço e gritei. Minhas irmãs me socorreram, mas nessa mesma noite ela tentou mais duas vezes, como eu já estava acordada me atraquei com ela, mas eu e minhas irmãs só conseguimos desarmá-la na terceira tentativa. Foi horrível! Um pesadelo, pois eu a amava e a amo. (falecida em 88). Se ela achou que eu tinha feito algo de errado, porque não agiu de outra maneira? Tentar matar a própria filha é tenebroso. Mas, já passou.

SIÉLLYSSON - Hoje se pudesse voltar ao tempo, você voltaria para Santa Rita?

MARIA DE LOURDES: - Se eu pudesse voltar no tempo não sairia de Santa Rita teria vivido lá todos os meus dias. Mas se fosse hoje a minha vida nessa cidade eu não voltaria, pois minha família é erradicada aqui. Tenho netos, bisnetos, genro, nora etc. Amo muito minha família. Também minha Santa Rita não existe mais! Como disse um filósofo: "passado são só lembranças, o futuro é um sonho. Temo que viver o hoje, porque o hoje amanhã será ontem".
SIÉLLYSSON - Que mensagem você quer deixar para os leitores desse blog?

MARIA DE LOURDES: - A mensagem que deixo para os leitores desse blog é que não tenham medo de enfrentar seus fantasmas, de ressuscitar seus anjos e demônios, que peguem caneta e papel e escrevam a história de suas vidas, seja o que tenha acontecido de bom e de ruim. Todos nós temos um passado. Os que ainda não têm, estão acumulando experiência e formando um.
Encerro agradecendo a você, Prof. Siéllysson, à oportunidade que me deu para falar um pouco da minha pessoa. Agradeço também ao Universo por está viva para conhecer uma pessoa tão especial que surgiu em minha vida e que tenho certeza não foi por acaso.
"Nam-miohô-renguê-kyô".

A imagem acima é a poetisa Maria de Lourdes Ferreira em 1952 quando era moradora de Santa Rita. Acervo pessoal da poetisa.



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