sábado, 21 de setembro de 2013

Café com Siéllysson entrevista o jovem historiador Azemar Júnior

Entrevista 13


 Fim de tarde, aguardo meu entrevistado para um café com sabor de história. Com cabelos úmidos, camisa preta, jeans básico e um sorriso largo Azemar dos Santos Soares Júnior fala sobre seu objeto de estudo no Doutorado em História, na capital do Brasil. O cuidado com o corpo é o tema central da nossa entrevista de “Café com Siéllysson”.


Siéllysson - Hoje, você trabalha com Medicalização, Corpo e Educação. Como é essa ponte entre Educação e Saúde?
AZEMAR - Na verdade eu transito entre três áreas medicalização do corpo, educação e medicina. Essa ideia faz parte de um projeto do qual os médicos da Paraíba do começo do século XX tinham. A proposta de orientar a infância para um corpo saudável, um corpo higiênico, por isso eles passavam a investir na infância na escola. Os discursos médico são trazidos à tona, os discursos eugênicos e higiênicos são trazidos para dentro da escola. Então eles tinham uma coisa que era muito legal: investir na infância para que se tornasse educada, higiênica, saudável e ainda levassem essas informações para casa, para educar suas famílias da mesma forma. Era basicamente o projeto dos médicos, especificamente do médico Flávio Maroja. E por isso eles recebiam constantemente notícias da Capital, Rio de Janeiro, que eram propostas dos médicos sanitaristas Renato Kehl, Belizaro Penna, e tantos outros médicos que trabalham com essa proposta. Então, a gente transita nas três áreas. Por quê? Porque nosso objeto de estudo é o corpo que vai ser medicalizado e este corpo está dentro da escola, daí entender como a escola se posiciona diante disso. Quais são as propostas pedagógicas? O que é a legislação Pedagógica? E o que o Currículo diz a cerca disso? Então a gente une as três coisas: história, Educação e Medicina.

SIÉLLYSSON – Essa relação Educação e Saúde ela tem seu início mesmo no século XIX ou século XX?
AZEMAR - Elas têm início no século XIX. As teorias higiênicas já existiam em meados do século XIX. E a gente tem todo um processo de higienização da cidade, que não se efetiva, mas que as teorias já existiam, a exemplo das teorias dos miavas, a ideia do “caldo pavoroso” do pântano que vai criar uma calamidade pública, uma grande quantidade de doenças. E tudo isso vai pesar na hora de ver esse projeto de higienização do século XIX. Os médicos vão está à frente, porém é uma coisa muito sutil que só funciona em época de epidemias (febre amarela, cólera, varíola) enfim, dessa forma, além disso, muito dificilmente vai ser posto em prática. As práticas especificamente as teorias do higienismo ela data do final do século XIX e passa a ser ressignificada e começa novos estudos que vão ser aprofundados no século XX.

SIÉLLYSSON – Você fez parte de um grupo de Estudo “Sociedade e Cultura na Paraíba Oitocentista”. Isso resultou num trabalho que se tornou o livro “Retalhos de História: Culturas Políticas e Educação no Nordeste do Brasil”. Nele você trabalhou a ideia de corpo...
AZEMAR – Trabalho nele com o corpo adoecido. Primeiro foi muito bom ter trabalhado com esse grupo, porque discussões sobre a Paraíba do século XIX foram e são feitas. É um grupo que já trouxe uma grande contribuição para a historiografia paraibana. A gente tem lá (UFPB) já vários livros publicados a partir do grupo. E especialmente no livro Retalhos da História nós temos duas contribuições que vem do grupo, uma minha e a outra da professora Serioja. Eu com o corpo adoecido e ela com a Paraíba que clamava perante o governo central no Rio de Janeiro determinadas reivindicações. Então, a gente traz essa contribuição pra o livro a gente chama isso de Retalhos da História, essa arrumação, em encaixe e a costura de temas que a gente organizou nesse livro, daí a proposta dos retalhos, a proposta de trazer textos dos mais diversos temas. Tem lá: o corpo adoecido; Paraíba do século XIX através de sua administração política; A Noite da Amargura lá em Aracajú; A Aldeia do Jerú, também em Aracajú; um artigo sobre Lampião e a gente tem o trabalho sobre o Corpo Cívico, que é de autoria de Vânia Cristina da Silva, e por fim, agente tem o trabalho sobre a Grande Guerra, como os livros didáticos trabalharam a Guerra do Paraguai também do século XIX embora o objeto aí seja os livros didáticos.

SIÉLLYSSON – Embora seja especificamente voltado para o século XIX o livro transita no século XIX para o século XX...
AZEMAR - Na verdade até antes, o livro traz artigos do Brasil Colonial como é o caso “A Aldeia do Jerú” que é uma aldeia indígena, que trabalha com catequese. A gente tem apenas esses dois artigos sobre o século XIX. Todos os outros estão fora do século XIX. Na verdade, o que veio do grupo são esses dois artigos, o restante é de pesquisadores que estão fora do grupo, mas que por um elo de proximidade de debate metodológico a gente acabou reunindo no livro.

SIÉLLYSSON – Você sempre trabalhou com a ideia de Corpo?
AZEMAR – (risos) Sempre trabalhei com a ideia do corpo em várias ideias diferentes.

SIÉLLYSSON – Eu me lembro da primeira vez que te encontrei, foi numa apresentação sua num Congresso na UFPB e você estava falando sobre “O corpo e os metros-sexuais”. Então ao ler o livro e encontrar alguns personagens históricos como Lampião, por exemplo, com uma vaidade, uma higiene mesmo dentro do sertão, mesmo dentro da Caatinga. Podemos dizer que ele faz parte do mundo dos metros-sexuais?
AZEMAR - (risos) Não. A gente não pode fazer essa relação por serem temas e períodos bastante distintos. Primeiro, a ideia de Metro-sexual data do final do século XX. É um modelo de corpo, é um comportamento, uma forma de se vestir, de se cuidar que foi ressignificada ao longo tempo. Você traz do metro-sexual a ideia do cuidado com o corpo, o cuidado com a aparência, de está sempre “atenado” com a moda, de saber o que você vai vestir, vai está sempre ressignificando coisas que antigamente foram deixadas de lado, mas que agora podem ser trazidas e atuar, como por exemplo, moda, estilo, dependendo da subjetividade de cada um.
                O que eu atribuiria a Lampião, como a diversos outros personagens daquele período, eles estavam inseridos dentro de uma proposta higiênicas, eles tinham cuidado com o corpo que era um pouco mais apurado que outras pessoas, visto que, os corpos não eram muito higienizados na época (risos suaves) até o começo do século XX. As pessoas que se cuidavam um pouco mais eram higiênicas, mas não atribuir a ideia de Metro-sexual, porque podemos correr o risco de anacronismo.

SIÉLLYSSON – Hoje há uma higienização maior, há uma conscientização na Educação nas cidades da Paraíba? Hoje seu trabalho de pesquisa envolve algumas cidades paraibanas. Quais são?
AZEMAR - Atualmente trabalho com duas cidades paraibanas, mas há uma proposta de serem três. Trabalho com a cidade de João Pessoa, com Campina Grande, e há a possibilidade de introduzir Cajazeiras que estou em negociação com minha orientadora. (risos) e se os documentos me permitirem também.
Hoje existe sim, todo um cuidado, todo um ritual desde o momento em que a gente acorda até o momento que vai dormir. Claro que, tem muita gente que são meio sujinhas, que parecem não ter feito as pazes com a água (brinca com a situação). Mas, a água limpa, purifica. Água limpa aquilo que é surjo e que pode trazer doenças pra a gente. Todo mundo tem hoje em dia esse cuidado de se cuidar, até porque as pessoas surjas, as pessoas que não cuidam de si não são aceitas em sociedade. Então, você precisa está bem consigo mesmo, está bem com seu corpo para ser aceito. Isso até mesmo dentro da sua casa. Então, graças a Deus são mais higienizadas.

SIÉLLYSSON – Seu objeto de estudo a graduação era já era o corpo?
AZEMAR - Sim. Comecei estudando o corpo, mas não tinha uma especificidade. Porque o corpo é muito abrangente, e eu passei muito tempo pra descobrir que existiam políticas do corpo, que você não faz somente um estudo da história política sendo uma política partidária, você faz um estudo da política do corpo. Então, o corpo está inserido na política, o corpo está inserido em todos os setores da sociedade a partir do momento e, que você cuida de si, que trata da sua beleza. Você não faz só pra si, você faz pra alguém, você quer mostrar alguma coisa pra sociedade em que você está inserido. É tanto que geralmente (repensa e continua) talvez hoje em dia nem tanto, mas até um tempo atrás o que você vestia dizia qual era o seu grupo social, a que classe social você pertencia. Hoje já não é tanto assim...
SIÉLLYSSON – Mas as marcas famosas, por exemplo, não é uma forma também de dizer exatamente isso?
AZEMAR - Sim!!! Mas você acha que os famosos usam aquela marca, mas existe hoje caso de pessoas que usam a calça identifica, com o mesmo timbre (etiqueta) da marca, mas é falsa...

SIÉLLYSSON – Mas a roupa ainda se ainda se torna um mecanismo de destaque social?
AZEMAR - Sim, sim... Positivo e de destaque social, sem dúvida.
(Retorna o início do assunto sobre seu objeto de graduação) Então, eu passei muito tempo tentando entender especificamente qual a trajetória do corpo que eu deveria seguir. E rumei pela história da beleza, pelo cuidado do corpo. Peguei um período que era a Revista O Cruzeiro e pude entender ali como um determinado grupo da elite cuidada de si. Saindo da graduação, entrei no Mestrado continuei com a história da beleza, só que um viés um pouco mais verticalizado que é tratando da higiene que não deixa de ser a história da beleza. A partir do momento em que você cuida do seu corpo, você cuida da beleza também. Está inserido nesse projeto. Tratei no Mestrado do processo de higienização e cuidado do corpo na cidade da Parahyba, que hoje é João Pessoa e no Doutorado continuo com esse projeto só que agora voltado pra Escola. Enquanto no Mestrado eu busquei entender como é que os médicos tentavam moldar essa população que aspirava ser higiênicas nos jornais e nas revistas. Agora a gente tenta entender como isso se dá dentro da Escola.

Siéllysson – E por que a cidade de Santa Rita não entrou?
AZEMAR - Porque Santa Rita não tinha uma documentação forte que me desse esse alicerce forte para época, a gente não tem. Algumas escolas já existiam, no meu recorte para o Doutorado vai de 1913 a 1945, com certeza as escolas de Santa Rita já existiam, mas a gente não tem essa documentação. A gente não tem as cadernetas método-padagógicas como a gente encontra nas escolas de João Pessoa, como na Escola de Nossa. S. das Neves, o Pio X, a Escola Normal, ou em Campina Grande no Alfredo Dantas. Embora Santa Rita seja minha terra natal e estejam aqui quase todas as pessoas que eu amo, a gente não teve como encaixar a cidade de Santa Rita na pesquisa...

SIÉLLYSSON – Eu também encontrei dificuldades para trabalhar com a documentação de Santa Rita no Mestrado...
AZEMAR - No Mestrado até que encontrei algumas notícias sobre Santa Rita, mas na verdade era uma notícia de um padre reivindicando alguma coisa e uma notícia de epidemia, de varíola, por exemplo. E sempre aparecia a reivindicação de um padre, porque o jornal era católico que era A Imprensa. Em outros jornais como O Norte, que já existia na época, e A União dificilmente existia alguma notícia sobre Santa Rita.

SIÉLLYSSON – Uma pergunta que eu faço a todos: (Rimos juntos) Qual a importância da cidade de Santa Rita para você?
AZEMAR - Eu tenho uma identidade que poderia ser mais forte com Santa Rita. Até outro dia conversando com o prefeito Marcos Odilon, que concordo com ele, quando ele diz que Santa Rita é uma cidade é uma cidade muito linda. De fato é! Especificamente porque é nessa cidade que a gente enramou as cordas do coração. Onde está a família da gente, é onde a gente foi criado, onde a gente se entendeu por gente. Foi aqui que criamos sonhos, foi aqui que a gente comemorou as vitórias. Então Santa Rita tem esse elo muito forte. Eu aprendi a amar a cidade a partir dessa corda do coração todos os meus sonhos foram acessados aqui.
A minha primeira professora foi minha mãe, então ela me ensinou que primeiro a gente tem que fazer o “dever de casa”, que a gente tem que cuidar primeiro da nossa casa. E Santa Rita é nossa casa. Embora as minhas pesquisas não incluam Santa Rita, não tenham sombra de dúvida é a cidade que eu quero morar por muito tempo.

SIÉLLYSSON – Que mensagem você deixaria para as pessoas que leem o blog?
AZEMAR - Primeiro, que ler é sempre muito bom e ler coisas boas é melhor ainda, então da mesma forma que a comida alimenta nosso corpo, as palavras alimentam nossa alma. Então, sempre que a gente encontrar pessoas disponíveis para falar um pouco de si, para revelar sua sensibilidade, tudo isso, alimenta nossa alma, nosso espírito. Que as palavras publicadas nesse blog alimentem o espírito, o coração e os preencham de luz e amor.
SIÉLLYSSON – Foi lindo, viu!
(Risos de ambos. Comento que o café esfriou e desligo a câmara)
Entrevista publicada em 30 março 2012  às 10:28 (sexta-feira)

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