sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Café com Siéllysson entrevista o assistente social Renildo Moraes

Entrevista 12


Ele é referência ao se tratar de trabalhos sociais com jovens em situação de risco, agora atua no mundo LGBT tornando-se popularmente o "Assistente Social do Mundo Gay". O entrevistado desta semana de  "Café com Siéllysson" é Renildo Moraes

Já tomei café com Renildo Morais, mais um santarritense que faz a diferença, em diversas situações e lugares, na minha casa, nos shoppings de João Pessoa, nos Cafés de Buenos Aires e em Montevidéu. Muitos assuntos já brotaram por horas, entretanto este será o café mais polêmico que vamos degustar partilhando nossa conversa com vocês, leitores.

SIÉLLYSSON - Qual sua formação acadêmica?
RENILDO - Sou Assistente Social, formado pela UFPB em 2006 e especialista em Adolescência e Juventude no mundo contemporâneo, pela FAJE-BH em 2009 e tive mais uma Especialista em Gestão Pública Municipal pela UFPB em 2011.

SIÉLLYSSON – Hoje você é Assistente Social do Centro de Referência dos Direitos do público LGBT e Combate a Homofobia no estado da Paraíba. Há receio das pessoas que precisam de ajuda seja psicológica, jurídica ou social na hora de buscar esse serviço que o estado oferece gratuitamente? Mesmo com todo debate social, principalmente na mídia sobre a homossexualidade, as pessoas ainda têm receio de assumir a sexualidade?
      RENILDO - Na perspectiva de iniciamos o diálogo sobre trabalho desenvolvido pelo Centro de Referência LGBT e Direitos Sexuais, se faz necessários compreendemos a sopa de letrinhas LGBT que é composta de quatro grupos que vivencia o preconceito de forma diferenciada.
L – Representando as Lésbicas. As lésbicas sentem desejos sexuais por outras mulheres, vivenciam romances e relações sexuais com outras mulheres. Não existe uma causa definida para o lesbianismo, assim como não se tem uma causa definida para qualquer tipo de orientação sexual.
G – Gay: é um termo de origem recente inglesa que é utilizado normalmente para se designar o indivíduo, (homem), homossexual.
B – BISSEXUAL - A bissexualidade consiste na atração física e/ou emocional por pessoas tanto do mesmo sexo quanto do oposto, com níveis variantes de interesse por cada um, e à identidade correspondente a esta orientação sexual.
T – TRANSEXUAL - Transexualidade é a condição considerada pela OMS (Organização Mundial de Saúde) como um tipo de transtorno de identidade de gênero. Refere-se à condição do indivíduo que possui uma identidade de gênero diferente a designado no nascimento, tendo o desejo de viver e ser aceito como sendo do sexo oposto. Usualmente os homens e a mulheres transexuais apresentam uma sensação de desconforto ou impropriedade de seu próprio sexo anatômico, desejam fazer uma transição de seu sexo de nascimento para o sexo oposto (sexo-alvo) com alguma ajuda médica (terapia de re-atribuição de gênero) para seu corpo. A explicação estereotipada é de "uma mulher presa em um corpo masculino" ou vice-versa, ainda que muitos membros da comunidade transexual, assim como pessoas de fora da comunidade, rejeitem esta formulação.
T – O outro “T” representa a TRAVESTIR - O travestismo está associado ao ato ou efeito de travestir-se, ou seja, de vestir-se ou disfarçar-se com roupas do sexo oposto.
O termo atual oficialmente usado para a diversidade no Brasil é LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros). A alteração do termo GLBT em favor de LGBT foi aprovada na 1ª Conferência Nacional GLBT realizada em Brasília no período de 5 e 8 de junho de 2008. A mudança de nomenclatura foi realizada a fim de valorizar as lésbicas no contexto da diversidade sexual e também de aproximar o termo brasileiro com o termo predominante em várias outras culturas. Em suma, seria melhor defini-los como Movimento dos Não-Heterossexuais o que seria um meio de exclusão, que não tem nada a ver com a proposta que é justamente de inclusão de todos que se identificam com a causa, direta ou indiretamente.
       O receito está muito presente na hora de buscar ajuda, como podemos identificar nos muitos usuários e usuárias que diariamente chegam ao Centro de Referencia LGBT, e falam que vieram conhecer, mas precisam saber como funciona o serviço, pois uma amiga vivencia o medo, ódio ou repulsa da própria homossexualidade.
      Esta atitude de medo, ódio ou repulsa da própria homossexualidade é considerada a homofobia internalizada é uma derivação da orientação sexual, tendo como diferença principal o fato de não ser reconhecida pelo próprio indivíduo, exteriorizando-se através de outras formas, enquanto nesta o indivíduo toma consciência de sua orientação e insatisfeito, deseja a alteração ou readequação desta a sua própria auto-imagem.
      Essa atitude se refere ao medo da discriminação social que os homossexuais são submetidos no cotidiano da sociedade brasileiro, que se apresenta como na violência física, psicológica, moral e simbólica.

SIÉLLYSSON – São Paulo está na Mídia como um dos estados brasileiros com maior número de agressões e crimes homofóbicos. Diante da realidade nacional você considera a Paraíba um estado homofóbico?
         RENILDO  -  Sim, nos últimos dois anos a Paraíba tem aumentado em cerca de 100% os crimes homofóbicos, em 2010 foram 10 assassinatos e 2011 foram 21 assassinatos.  Pois segundo o Movimento do Espírito Lilás (MEL), que faz o controle dos casos de homicídios por motivo de orientação sexual, foram assassinados 21 pessoas na Paraíba em 2011 por crimes que tiveram motivação homofóbica. O MEL é uma organização não governamental. Em pouco mais de uma década, entre 1990 e 2011, o MEL registrou 128 mortes de LGBTs no estado. Em 2010, o grupo contabilizou onze mortes deste tipo.
Conforme o levantamento, entre as vítimas do ano passado estão 11 gays, seis travestis ou transexuais, três lésbicas e um bissexual. Os crimes aconteceram nos municípios de João Pessoa, Campina Grande, Queimadas, Sousa, Cabedelo, Bananeiras, Santa Rita e Patos. O relatório foi elaborado em parceria com a Comissão da Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo da Ordem dos Advogados do Brasil – seccional Paraíba.
O delegado Marcelo Falcone, que trabalhou cerca de dois anos na Delegacia Especializada em Crimes Homofóbicos em João Pessoa, explicou que os crimes contra LGBTs são mais bárbaros. Como ele mesmo disse numa entrevista que "Os assassinos querem punir as pessoas pela orientação sexual. É possível observar requinte de crueldade”.

SIÉLLYSSON – Esse comportamento homofóbico da Paraíba é um caso isolado do Nordeste?
      RENILDO - Não. De acordo com Mapa de assassinados dos homossexuais brasileiro em 2010, apresento pelo GGB – Grupo Gay da Bahia, revela que o Nordeste é região mais homofóbica: abriga 30% da população brasileira e registrou  43% dos LGBT assassinados. 27% destes crimes letais ocorreram no Sudeste,  9% no Sul,  10% no Centro-Oeste, 10% no Norte. O risco de um homossexual do Nordeste ser assassinado é aproximadamente 80% mais elevado do que no sul/sudeste! 36% destes homicídios foram cometidos nas capitais, 64% nas  cidades do interior.
Quando questionaram a presença da homofobia nos crimes contra homossexuais, o Prof.Luiz Mott do GGB argumentou que: “quando se divulgam estatísticas de crimes contra mulheres, negros, índios, não se questiona se foram ou não crimes motivados pelo ódio, sem falar na sub notificação dos “homicídios”. Nos crimes contra gays e travestis, mesmo quando há suspeita do envolvimento com drogas e prostituição, a vulnerabilidade dos homossexuais e a homofobia cultural e institucional justificam sua qualificação como crimes de ódio. É a homofobia que empurra as travestis para a prostituição e para a margens da sociedade. A certeza da impunidade e o estereótipo do gay como fraco, indefeso, estimulam a ação dos assassinos.” 

SIÉLLYSSON – Dentro do mundo LGBT qual é o público que sofrem mais com a discriminação? E por quê?
     As TRAVESTIS são as que mais sofrem e sofrem discriminação e preconceito múltiplo. Sua imagem ambígua, uma mistura do que se convencionou chamar de características masculinas e femininas, assusta grande parte das pessoas por não ser “permeável” à inteligibilidade da cultura.

SIÉLLYSSON – E a situação delas na escola?
RENILDO - A escola é um espaço discriminação diária, para fugir do sofrimento, muitas vezes a saída é abandonar os estudos. É raríssimo encontrar um travesti no ensino médio. A escola não aceita, a prostituição acaba se tornando praticamente a única opção de sobrevivência, a família expulsa de casa... Como diria as maiorias das travesti que são atendidas pelo Serviço Social do Centro de Referencia LGBT, as travestis são “expulsas da vida”. Elas relatam, ainda, que muitas travestis de sua época já morreram ou estão doentes.

SIÉLLYSSON – Percebe-se que dentro do mundo LGBT a prostituição é maior com as travestis?
RENILDO - Sim, para ilustrar essa pergunta usarei a frase da ativista Gel Laverna, presidente da Associação da Travesti e Transexuais da Paraíba. “Se não for a salão de beleza, clínica de estética ou oficina de corte e costura a travesti só consegue trabalho na prostituição”. A afirmação parece demonstrar que as travestis são bem aceitas entre as mulheres. Porém, o mesmo não se pode dizer em relação aos homens que as usam sexualmente e que geralmente as repudiam, se encontradas casualmente num ambiente socialmente comum ou na rua. E esse repúdio se dá evidentemente em razão do medo que aquele homem tem de ser censurado pelas pessoas de sua vida cotidiana.
                O preconceito não é exatamente porque possa ser homossexual, mas sim porque usa roupas e formas femininas. Não é exatamente uma discriminação às mulheres, mas ao novo gênero sexual daquele ser travestido. Os meninos gays são alvos muitas vezes de gozações, mas não sofrem ostensiva discriminação tal como acontece com os travestidos. O dia a dia nos mostra que há preconceito inclusive entre os diversos grupos de diferentes. E essa mentalidade preconceituosa e discriminatória precisa ser mudada primeiramente nestes. As travestis que, por necessidade de sobrevivência, aderiram à prostituição são normalmente procuradas por homens heterossexuais e bissexuais e também por mulheres.

SIÉLLYSSON – A visão que a sociedade tem sobre os gays é de que a maioria seja promíscua. Por que a maior parte dos relacionamentos homo-afetivos é de curta duração? É algo cultural no mundo LGBT ou faz parte da condição da sociedade moderna?
      RENILDO - Para responder tais indagações é necessário olhar o mundo de forma ampla, estamos vivendo na contemporaneidade, onde os conceitos de bipolaridade entre o bem e mal, branco e preto, fraco e forte, estão presentes nas pessoas. Como também o conceito de tudo é para sempre. Já dizia Renato Russo na música Por Enquanto, “O pra sempre, sempre acaba”. O conceito de experimentar está presente no cotidiano das pessoas, homem, mulheres, heterossexuais, homossexuais e bissexuais.
      Hoje há quem diga que gay é promíscuo. Mas tenho certeza que se eu perguntar a cada pessoa o significado desta palavra não terá a mesma resposta, até porque, esta palavra tem como origem o latim, e como tudo em nossa vida evolui esta palavra também evoluiu e seu significado se dissipou por todo o nosso vasto mundo de ideias e palavras. Promíscuo é aquela pessoa de baixo nível, confusa de suas ideias, que ultrapassa regras e valores da sociedade. Não acho que os gays sejam promíscuos, já que homens e mulheres héteros também saem simplesmente para transar ou se satisfazer sexualmente. Bingo! Isso é verdade! Então por que será que hoje o gay é visto como promíscuo?
Aliás, o gay é visto muito mais além de promíscuo, é visto também como infiel e na verdade ele é mesmo! Lembra a questão de escolha? A infidelidade faz parte de uma escolha. A infidelidade não significa, necessariamente, falta de amor ou de tesão. Os motivos que levam alguém a trair podem ser os mais evidentes como também, os mais íntimos e aparentemente inexplicáveis. A traição esta atrelada a promiscuidade, até porque ela é uma característica do promíscuo, não acham?
Acho um pouco errado julgar a ação de um gay por todos, ou seja, se um é promíscuo, não posso dizer que todos são, assim que não posso dizer que todos são infiéis e assim por diante. Héteros são promíscuos também, existem muito. E infiéis então? Nem se fale, mas sabe o que acontece? O preconceito é tão intenso que automaticamente as pessoas fingem não ver o que a sociedade acha o certo e acaba por julgar uma classe que já é julgada constantemente, enfim, eu só lamento. Mas existem sim, gays promíscuos, como existem gays que só querem ser normais, querem ter um relacionamento, querem só viver.

SIÉLLYSSON - Que mensagem você deixaria para os leitores do “Café com Siéllysson”?
RENILDO - Viver faz parte, ter seus momentos de loucura, confusão é, sem dúvida, ótimo! Sair por ai conhecer pessoas, ficar com esse, ou aquele é legal, mas posso te garantir uma coisa: Não tem coisa melhor, mais gratificante e maravilhosa é você estar com uma pessoa que você goste e que goste de você, uma pessoa que te satisfaça e que você consiga satisfazer.

A entrevista foi publicada em 19/fev./2012 às 19:28 (domingo)

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